Portal Brasil

“Cada minuto dentro do presídio estudando valeu a pena”

Sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, lei 13.163 prevê obrigatoriedade de Ensino Médio em presídios do País; para ex-detentos, estudos representaram mudança de vida


por Portal Brasil


publicado:
21/09/2015 08h58


última modificação:
21/09/2015 11h01

A trajetória do ator Eduardo Nascimento no teatro começou em um presídio de segurança máxima. A falta de oportunidades, o desamparo familiar e a convivência com ‘más influências’, diz ele, levaram-no a entrar para o mundo do crime. Aos 18 anos, ele foi condenado por latrocínio, como é conhecido o roubo seguido de morte. “O fato de ter sido hediondo e de eu ter sido penalizado com 20 anos, para mim, eu nem sairia do sistema penitenciário”, relatou ao Portal Brasil.

O que era pra ser o fim de uma vida marcada pela falta de oportunidades transformou-se em um recomeço quando Eduardo, 34 anos, teve a chance de estudar dentro do sistema prisional. Em meio à convivência com outros criminosos, ele se deu conta de que a educação era a única saída para deixar o crime. Os estudos passaram a representar esperança de uma vida melhor e um atalho para reaver a liberdade.

O mesmo ocorreu com Raimundo Freitas Gomes, de 43 anos. Com apenas a 4ª série completa, o crime lhe pareceu o único caminho a seguir. O resultado foi uma condenação de 44 anos. Assim como Eduardo, em vez de se especializar na transgressão, Raimundo encontrou no sistema prisional uma nova chance. Em 2010, completou o ensino médio na penitenciária e mirou um objetivo, cursar uma faculdade. “Eu tinha só a 4ª série, comecei estudando e estudando, e tive a oportunidade de passar em dois Enem. Meu sonho é fazer faculdade de Serviço Social”, completa Raimundo.

É para dar uma nova chance a todos os Eduardos e Raimundos que por algum motivo se encontram dentro do sistema prisional brasileiro que a presidenta Dilma Rousseff sancionou, na quinta-feira (10), a lei 13.163. A partir de agora, todos os detentos do País têm o direito de cursar o Ensino Médio, seja ele regular, supletivo, com formação geral ou educação profissional, enquanto cumprem suas penas. Além disso, a União, os estados e municípios terão de incluir o atendimento aos presos em seus programas de educação à distância e de utilização de novas tecnologias de ensino.

A nova lei pretende enfrentar um quadro complexo. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo. Em números absolutos, são 607.700 presos segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), divulgado em 2015. Desse total, os pesquisadores conseguiram mapear o grau de escolaridade de apenas 40% dos presos. Desses cerca de 240 mil detentos, 53% não concluíram o Ensino Fundamental. Por sua vez, um levantamento do Conselho Nacional de Educação revelou, em 2012, que apenas 8% dos detentos têm o Ensino Médio completo.

Embora as recordações do período em que esteve detido ainda o atormentem, a reviravolta proporcionada pelos livros é motivo de orgulho para Eduardo. Atualmente, o trabalho do ator é dedicado a jovens submetidos às mesmas condições dele, anos atrás. “Hoje, eu dou graças a Deus por ter conhecido o colégio, por ter conhecido o teatro. Eu ainda não conquistei tudo que eu queria, mas eu conquistei o mais importante: o amor próprio, uma boa educação e a minha liberdade”, afirmou. “Cada minuto dentro daquele presídio estudando valeu a pena, cada hora dedicada com o livro na mão valeu a pena”.